terça-feira, 11 de agosto de 2009

Alimentação e Ansiedade

Princípios dietéticos
Muitas pessoas não se dão conta do importante papel que a seleção de alimentos pode desempenhar na intensificação ou na redução de sintomas de ansiedade, pânico e estresse excessivo. As pesquisas médicas nas áreas de dieta e nutrição, nos últimos trinta anos, demonstraram que muitos alimentos, bebidas e suplementos alimentares podem agravar ou desencadear sentimentos de ansiedade. Em contrapartida, outros estudos concluíram que certos alimentos são benéficos por suas propriedades calmantes e estabilizadoras do estado de ânimo ou humor.
Alimentos a serem evitados
Cafeína (café, chá preto, refrigerante à base de cola, etc.)A cafeína deflagra ansiedade e até sintomas de pânico porque exercita diretamente vários mecanismos de estimulação do corpo. Eleva o nível de noradrenalina do cérebro, um neurotransmissor que aumenta a vivacidade. Além disso, a cafeína estimula a descarga de hormônios do estresse, principalmente o cortisol, a partir da estimulação das glândulas supra-renais, intensificando ainda mais os sintomas de nervosismo e agitação.
Açúcar
Com o predomínio do açúcar simples em muitos alimentos, nossa sociedade acaba por produzir milhares de viciados em açúcar em todas as faixas etárias. A excessiva ingestão de açúcares pode ser um importante fator no surgimento de sintomas de ansiedade. A questão ocorre da seguinte forma: em vez de carboidratos complexos, os alimentos baseados em açúcares e farinha branca decompõem-se facilmente no tubo digestivo, assim, a glicose é liberada rapidamente na corrente sanguínea e daí absorvida pelas células do corpo a fim de satisfazer suas necessidades energéticas. Para dar conta dessa repentina sobrecarga, o pâncreas libera grandes quantidades de insulina – uma substância que realiza o transporte da glicose do sangue para dentro das células do corpo.A pessoa pode se sentir inicialmente eufórica, após ingerir açúcar, e depois sentir um rápido choque e um mergulho profundo em seu nível de energia. Quando o nível de açúcar no sangue fica demasiadamente baixo, a pessoa sente-se ansiosa, agitada e confusa porque o cérebro é privado do seu combustível maior. Para tentar remediar essa situação, as glândulas supra-renais liberam cortisol e outros hormônios que estimulam o fígado a liberar o açúcar que ele tem armazenado, de modo que o açúcar no sangue possa voltar aos níveis normais. O problema é que o cortisol, além de estimular a elevação dos níveis de açúcar no sangue, também aumenta, infelizmente, os sintomas de axcitação e ansiedade.
Álcool
O álcool é também um açúcar simples, por isso é rapidamente absorvido pelo organismo. Tal como os açúcares o álcool aumenta os sintomas de hipoglicemia, e o seu uso excessivo pode aumentar a ansiedade e as oscilações de humor.O sistema nervoso é particularmente suscetível aos efeitos deletérios do álcool, uma vez que esse atravessa facilmente a barreira de irrigação sanguinea do cérebro e destrói as células cerebrais. Em função disso, o álcool pode causar profundas mudanças comportamentais quando consumido em excesso. Os principais sintomas incluem a ansiedade, a depressão, os acessos irracionais de cólera, a baixa capacidade de julgamento, a perda de memória, vertigens e a coordenação motora deficiente.
Laticínios e Carnes Vermelhas
Devem fazer parte da dieta de forma moderada, uma vez que ambos os tipos alimentares são de digestão extremamente difícil para o organismo. Por essa razão podem agravar a depressão e a fadiga que coexistem em muitas pessoas com sintomas de ansiedade.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Síndrome do Intestino Irritável

O segundo cérebro


Reduzido à essência, o aparelho digestivo é um tubo no qual órgãos como fígado, pâncreas e glândulas salivares despejam secreções para ajudar a digestão e absorção dos nutrientes necessários para a manutenção das funções vitais.Como é essencial que os alimentos engolidos progridam no interior do sistema, a seleção natural elegeu mecanismos de alta complexidade para assegurar movimentos de contração e relaxamento da musculatura das paredes do tubo digestivo que conduzam o bolo alimentar até o meio externo. A eles damos o nome de ondas peristálticas.Uma extensa circuitaria de neurônios disposta ao longo do tubo, conectada com o cérebro e com a medula espinhal, controla o ritmo das ondas peristálticas. Hormônios e mais de trinta substâncias conhecidas como neurotransmissores ajudam a modular os impulsos nervosos que trafegam de um neurônio para outro, com a finalidade de fazer o ajuste fino dos movimentos de contração e relaxamento que dão origem e mantém as ondas.Esses mecanismos são tão eficazes que o aparelho digestivo pode realizar suas tarefas independentemente do sistema nervoso central. Nos traumatismos cranianos que interrompem as conexões nervosas do cérebro com o resto do corpo, todos os movimentos desaparecem, mas o aparelho digestivo continua a funcionar por conta própria, como se fosse dotado de um cérebro próprio.

A conexão serotonina
A coordenação precisa entre os sinais enviados pelos neurotransmissores e os impulsos nervosos que caminham de um neurônio para outro, garantem funcionamento harmonioso, rítmico, do aparelho digestivo.Quando os alimentos caem no estômago, ocorre liberação de hormônios e neurotransmissores que provocam o ato reflexo conhecido como reflexo gastrocólico, verdadeira ordem para que as alças intestinais se movimentem. Um dos neurotransmissores mais atuantes na transmissão de mensagens entre os neurônios do aparelho digestivo é a serotonina. Fatores que alteram a produção de serotonina, ou modificam as características dos receptores aos quais ela se liga, podem desorganizar os movimentos intestinais e causar constipação (prisão de ventre), diarréia, dispepsia (digestão difícil) e a síndrome do intestino irritável.

Constipação
Constipação é o termo científico correspondente à prisão de ventre, condição caracterizada pela diminuição da freqüência e/ou do volume das evacuações, desconforto ao evacuar e fezes endurecidas. Estudos mostram que 10% a 20% dos adultos se queixam de constipação. A incidência nas mulheres parece ser duas vezes maior.Há dois tipos de constipação crônica. O primeiro é caracterizado por lentidão do trânsito intestinal. No segundo, a freqüência das evacuações pode ser normal ou mesmo aumentada, mas o volume está reduzido e as fezes são difíceis de eliminar. Nos dois casos há sensação de esvaziamento incompleto do conteúdo intestinal. Existe uma tendência entre os gastroenterologistas de considerar a constipação crônica, como parte da chamada síndrome do intestino irritável.
SIR (síndrome do intestino irritável)Antigamente chamada de “colite nervosa”, nessa síndrome não encontramos alterações patológicas no intestino. A SIR é causada por alterações no mecanismo de sinalização mediado pela serotonina (e por outros neurotransmissores) e seus receptores, que desorganizam as ondas peristálticas modificando os hábitos intestinais.


1 - Formas de apresentação - classicamente, a SIR costuma ser subdividida em três grupos:1.1 – SIR com predomínio de constipação;1.2 – SIR com predomínio de diarréia;1.3 – Forma alternante, em que constipação e diarréia se alternam.Atualmente, a utilidade dessa classificação tem sido questionada porque a separação entre os grupos não é clara e são freqüentes os casos que se instalam com prisão de ventre e evoluem com diarréia, ou com alternância de diarréia e constipação.

2 - Diagnóstico - como não existem achados anatômicos responsáveis pelo aparecimento da SIR, o diagnóstico é feito clinicamente, depois que o médico ouviu as queixas, interpretou os sintomas, pediu exames e excluiu a possibilidade de patologias mais graves. É importante lembrar que sintomas como diarréia e constipação podem ocorrer no câncer de cólon e em doenças inflamatórias intestinais como a retocolite ulcerativa e a doença de Crohn, patologias que exigem a realização de colonoscopia, para visualizar o revestimento interno do intestino grosso.Vários critérios foram estabelecidos para ajudar os médicos a padronizar o diagnóstico. Para exemplificar, vamos citar os critérios Manning, estabelecidos em 1978, e os de Rome II publicado em 1999:


2.1 – Critérios de Manning
Dor abdominal aliviada ao evacuar;
Fezes amolecidas;
Evacuações mais freqüentes quando as dores se instalam;
Distensão abdominal;
Presença de muco nas fezes;
Sensação de que a evacuação foi incompleta.


2.2 – Critérios de Rome II
Pelo menos 12 semanas -- que não precisam ser consecutivas --, nos últimos 12 meses, de desconforto abdominal ou dores que tenham pelo menos duas das três características abaixo:
a) sensação de alívio ao evacuar e/ou b) instalação associada com mudança na freqüência das evacuações e/ou c) instalação associada à mudança no formato das fezes.
Vários autores, no entanto, sugerem que os médicos adotem uma definição mais abrangente: “desconforto abdominal associado a alterações dos hábitos intestinais”.


3 - Tratamento da SIR
Prisão de ventre, flatulência, desconforto abdominal, dor, diarréia, urgência para ir ao banheiro e dificuldade para evacuar, sintomas característicos da enfermidade, podem interferir com a qualidade de vida de seus portadores e exigir tratamento. Muitas vezes, os pacientes só procuram ajuda depois de tentativas infrutíferas de resolver o problema pelo uso crônico de laxantes, lavagens e de tratamentos caseiros inadequados.


4. - Medidas gerais e cuidados dietéticos - são aconselháveis em todos os casos: hidratação adequada, atividade física, alimentar-se em intervalos regulares e usar o banheiro num mesmo horário para estabelecer um ritmo diário, assim como evitar comidas picantes, muito salgadas, com excesso de condimentos ou conservantes, doces concentrados e alimentos que provocam gazes (feijão, grão de bico, repolho, etc.). Em certos casos é preciso cuidado com o leite (60% a 70% da população com mais de 60 anos apresenta algum nível de intolerância à lactose). As fibras devem ser selecionadas de acordo com a presença de diarréia ou constipação. As fibras solúveis, como as encontradas em polpas de frutas e alguns cereais ajudam a formar e compactar o bolo fecal. As insolúveis, presentes na casca das frutas, em alguns cereais e em todas as verduras, não têm o poder de compactar o bolo, e funcionam como laxantes.Embora sempre úteis essas medidas costumam ser insuficientes para controlar os sintomas: a maioria dos pacientes necessita de medicamentos. Os mais utilizados são:
Antiespasmódicos: Embora úteis para aliviar sintomas, as reações indesejáveis limitam seu uso. Devem ser empregados com cuidado nos casos de constipação;
Agentes que aumentam o bolo fecal: Os estudos mostram que os portadores da SIR nem sempre se beneficiam da adição de fibras a suas dietas. Em alguns casos, elas podem piorar a flatulência. Embora sua utilidade não tenha sido demonstrada na SIR, as fibras estão indicadas no tratamento da constipação;
c) Agentes antidiarréicos: Os estudos mostram que medicamentos como a loperamida são eficazes contra a diarréia, mas não melhoram os sintomas nem as dores abdominais da SIR. Portanto, não devem ser usados se houver constipação;
Antidepressivos tricíclicos: Como os portadores de SIR sentem mais dor do que o normal quando o intestino se distende, e esse grupo de drogas interfere com a transmissão do estímulo doloroso, alguns trabalhos procuraram avaliar sua eficácia. Os resultados não foram suficientemente significantes para recomendar seu emprego na síndrome, mas há evidências de que possam melhorar as dores. Estão contraindicados em quadros de constipação porque podem agravá-los.
Antagonistas do receptor 5HT3 da serotonina: usados para inibir as náuseas provocadas pela quimioterapia do câncer. Esses agentes diminuem a sensação de desconforto causada pela distensão do cólon e retardam o trânsito intestinal. Estão indicados apenas nos casos de diarréia;
Agonistas do receptor 5HT4 da serotonina: O único medicamento desse grupo, aprovado para uso é o tegaserod. Esse agente estimula o reflexo peristáltico, acelera o trânsito intestinal, reduz as descargas elétricas dos neurônios que conduzem estímulos nervosos para o reto e reduz a sensibilidade abdominal. Seu uso durante 12 semanas, seguidas de reavaliação clínica, e administração por períodos mais longos, se houver resposta favorável, é considerado tratamento de escolha não apenas nos casos de SIR com constipação, mas também na constipação crônica.


5 -Conclusões - não vai longe o tempo em que a síndrome do intestino irritável era interpretada como simples distúrbio alimentar, provocado pelo estresse em pessoas nervosas. Hoje sabemos que se trata de uma doença crônica, causada por alterações de hormônios e neurotransmissores que modulam os movimentos peristálticos. Seu tratamento exige cuidados dietéticos, orientação médica e medicamentos de uso prolongado para controlar os sintomas e melhorar a qualidade de vida.

Drauzio Varella